Avaliação psicológica

nycolas ribeiro
2 min readMay 8, 2017

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Dois meses depois, o celular finalmente tocou. “Você poderia vir aqui na sexta, às 8h, para fazer uma avaliação psicológica?”. O timing da ligação foi perfeito, já que continuo sem dinheiro para pagar por terapia e maio já tinha me agendado um punhado de desventuras antes mesmo de começar. Confirmei a consulta e segui o dia.

De noite, o pensamento de ser avaliado psicologicamente me causou um nervosismo que não tinha previsto: eu sempre tinha sido coadjuvante nas idas à terapeutas e psiquiatras, então era inédito sentar em outro lugar a não ser a sala de espera. E quanto mais se aproximava a avaliação, mais a inversão de papeis me incomodava.

No caminho até lá ensaiei o que falar, sem ao menos saber o que seria perguntado. “E se eu não for ‘interessante’ o suficiente?”, pensei. E se estiverem esperando um caso de transtorno de personalidade antissocial e eu chegar com um “estou me sentindo muito sozinho”? Não é exatamente o que um estagiário de psicologia está esperando numa manhã de sexta, e isso talvez não me ajudasse a passar na triagem para conseguir terapia gratuita por um semestre.

A pergunta “o que está acontecendo com você?” me acertou como um tiro a queima roupa e os ensaios que fiz no caminho se mostraram inúteis. Afinal, o que está acontecendo comigo? Era a pergunta mais simples que eu não tinha feito. Então resisti o impulso de responder “vim aqui justamente para você me responder isso” (cedo demais para piadas passivas-agressivas) e permaneci pensativo enquanto a feição da pessoa que me observava me deixava ainda mais apreensivo.

O término recente de um relacionamento, a saúde da minha mãe e o aumento do aluguel foram os tópicos que me vieram à mente, mas por fim, relatei exatamente o que aconteceu para ter me inscrito no programa de assistência psicológica: a vida está acontecendo. Cada vez mais e com mais força, ao mesmo tempo que é tão vaga quanto essa minha resposta. E é por isso que eu senti que era a hora de ser a Mercedes da minha Martha Medeiros.

Ainda não sei se passei na triagem, mas saí da avaliação mais orgulhoso e consciente de mim, o que seria bom se esse sentimento não tivesse durado 20 minutos. Bastou eu ouvir a palavra “cliente”, checar a pilha de boletos e ouvir Tom Odell para eu me perguntar “o que está acontecendo comigo?”. E talvez seja por isso que algumas sessões de terapia seja o que realmente está faltando em minha vida.

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